Pular para o conteúdo principal

Educação Clássica e Educação Domiciliar - Douglas Wilson (Resenhas #2)

Nos últimos meses, educação tem sido um tema que tenho me interessado em saber um pouco mais. Comecei minhas pesquisas lendo algumas coisas sobre/de Paulo Freire e o forte influenciador de seus pressupostos: Antônio Gramsci. O que encontrei foi deprimente e me auxiliou no entendimento da decadência da educação brasileira, o que me levou a escrever um estudo sobre o que li, que ainda não publiquei em lugar nenhum, mas muitas pessoas já me auxiliaram lendo, comentando e opinando sobre. Depois disso, decidi que compraria alguns livros sobre educação a partir de uma cosmovisão cristã, pois havia visto muito sobre os problemas de uma cosmovisão marxista, mas pouco sobre as soluções propostas por educadores cristãos.


O livro Educação clássica e Educação Domiciliar de Douglas Wilson, junto com Wesley Callihan e Douglas Jones, foi minha primeira leitura sobre o tema. O livro é curto, podendo mais ser considerado um breve ensaio, com 60 páginas. Tem por propósito instigar os pais a aceitarem o desafio de cumprirem o seu papel de educador na vida dos seus filhos, entendendo que isso exigirá grande esforço. O livro não entra em termos de educação apenas em casa, mas sim de os pais se preocuparem em participar da educação formal dos filhos. Para isso, o autor mostra que será necessário que antes os pais estudem e se tornem leitores assíduos, tanto pelo exemplo quanto pela qualidade de ensino que eles darão aos seus filhos. 

O método proposto pelo autor é o Trivium, aplicando-o a partir de uma cosmovisão cristã. Este método é composto por três estágios: gramática, lógica e retórica. Durante minhas pesquisas iniciais sobre educação, encontrei algumas informações sobre este método e resolvi perguntar para alguns pedagogos que conheço se eles já tinham ouvido falar sobre. Surpreendentemente a resposta foi negativa na maior parte das vezes, principalmente dentre os recém-formados ou em formação, o que mostra que a educação clássica tem sido simplesmente ignorada diante dos métodos desconstrucionistas. 

O autor traz vários exemplos da utilização deste método e como ele era visto nas primeiras universidades. Após isso, ele dedica 4 capítulos para lidar com estes três estágios da educação. Tentarei resumir um pouco sobre cada um.

O primeiro estágio, a gramática, é definido pelo autor não como apenas o estudo da linguagem e das regras de seu uso. Este estágio envolve também literatura, história e matemática básica. Wilson busca mostrar que o entendimento dessas disciplinas é o básico para todo o resto do desenvolvimento, são a base de tudo e não podem ser deixadas para que a criança descubra tudo por si só. É necessária uma condução mais aproximada. Contudo, ele indica a leitura de ficções tanto para os pais quanto para as crianças, pois este tipo de leitura incentiva a exploração da criança no entendimento das estruturas da realidade e que os pais cristãos não devem se sentir intimidados em darem e lerem livros ficcionais com medo que a criança tenha contato com coisas “seculares”. Este tipo de “protecionismo” pode trazer mais males que benefícios. 

O autor também faz uma defesa do ensino de línguas clássicas, como latim e grego, pois boa parte dos idiomas modernos derivam destas línguas. Contudo, considerei a ênfase do autor neste tipo de ensino um pouco exagerada e os benefícios não tão claros como ele tenta mostrar.

O segundo estágio é a lógica, que também pode ser chamada de dialética. Neste estágio a criança é apresentada aos silogismos, a ordem da realidade e a necessidade de entender as coisas baseado na lógica. Para tanto, os pais podem ensiná-la a identificar as falácias lógicas mais comuns, sendo capazes de negar um raciocínio falacioso mesmo que elas não entendam sobre o tema apresentado, apenas por ele violar leis lógicas. Ele denota que na cultura em que estamos, onde a verdade, a coerência e a lógica não são mais levadas tão a sério como deveriam, haverão muitos confrontos com a sociedade por causa deste ensino, mas ao mesmo tempo, toda a cosmovisão cristã clama por ele e, portanto, é parte da tarefa dos pais ensiná-lo. 

Trabalho com programação, o que pode ser considerada uma ciência exata, e a lógica de pensamento é um requisito básico para esta profissão. Conforme conheço pessoas da área, principalmente estudantes, vejo que a maior dificuldade deles é o pensamento lógico: a capacidade de estruturar premissas e organizar uma sequência de pensamento, encontrando incoerências e falhas nos seus próprios sistemas. Cito minha profissão como exemplo, mas claramente este não é um problema apenas profissional. Vemos cada vez mais a falta de pensamento coerente e lógico e a conformidade da sociedade de viver com pressupostos opostos e seguir ideias contraditórias sem se preocuparem com isso.

O terceiro e último estágio é o da retórica. Muitos veem a retórica como algo ruim, como a “habilidade de enganar as pessoas com palavras bonitas”. Contudo, ainda que ela possa ser usada para tal, a retórica é a capacidade de expressar com a linguagem um pensamento lógico de forma que seja simples para o ouvinte entende-lo. Isso exige capacidade de organizar seus pensamentos e pensar antes de falar. É através desta habilidade, por exemplo, que nos tornamos capazes de encarar a batalha pela cosmovisão cristã ante cosmovisões opostas. Quando negligenciamos o estudo e ensino desta habilidade, estamos enfraquecendo a intelectualidade cristã.

A batalha se desdobra, matando e mutilando, esmagando e rugindo, mas parte do cristianismo contemporâneo com adesivos de para-choques e seminários de autoestima. O inimigo sorri e planeja aniquilar nossos filhos e destruir nossas igrejas, mas tentamos minimizar nossas diferenças com quem nos ataca e usamos as instruções deles como modelos para as nossas. Eles zombam de Cristo na nossa cara, mas aprendemos a relaxar, fazer uma piada e criar uma atmosfera de adoração mais divertida. A única coisa pior que ser esquartejado no meio de uma guerra é nem perceber a ação. (P. 49)

O trecho acima foi retirado do capítulo “O básico da cosmovisão cristã”, sucessor do capítulo sobre a retórica. Porém, os dois estão bastante ligados. Quando negamos aos nossos estudantes a habilidade do confronto e do estudo e aplicação do conhecimento e da lógica através de um bom uso da linguagem, enfraquecemos toda a nossa forma de lidar com a oposição ao cristianismo e nos excluímos dos debates centrais da sociedade.

Por fim, o livro auxilia o leitor a montar um currículo, através de dicas e de indicações de leitura, das quais várias marquei para eu mesmo ler. Mesmo com suas limitações e talvez a pouca flexibilidade no método proposto, o livro mostra uma alternativa de educação muito mais benéfica e organizada, preocupada tanto com o conhecimento quanto com a vida da criança. Creio que este livro me ajudou a expandir os horizontes e facilitou meu entendimento dos próximos livros sobre educação que estão na fila de leitura para este ano.

Comentários

Unknown disse…
Muito bom, estava deixando ele para mais tarde (compra), mas irei subir ele na lista de livros a serem adquiridos nos próximos meses, excelente resenha man, grande abraço!